Como Analisar Os Sonhos A Partir Da Teoria Freudiana

Os sonhos sempre têm um significado. Mas quais são eles?

Amanda Aragão
4 min readMar 4, 2021
Alice no País das Maravilhas | Ilustração: Alexandria Slens

Fantasia e Sonho

Para a Psicanálise, a fantasia é um meio de realizar desejos de forma subjetiva, através da imaginação. Essa realização acontece apenas no campo imaginário do indivíduo, não tendo qualquer relação com a realidade.

Sonho e fantasia estão intrinsecamente ligados. Catárticos, sonhos são meios de realizar desejos conscientes ou inconscientes, tendo a fantasia como papel principal, seu condutor. Para Freud, a maioria dos acontecimentos nos sonhos são desejos reprimidos gerados a partir do que guardamos escondido no nosso inconsciente. Freud ainda afirma que nos adultos os sonhos podem apresentar problemas a serem solucionados, além da manifestação e realização de desejos; no entanto, sonhos infantis seriam apenas realizações de desejos.

Através dos tempos, ao sonho foi dada a importância de serem premonitórios em diferentes religiões e crenças. Algumas crenças também consideram que o sonho é um meio de expandir a consciência e que seria possível até mesmo visitar os sonhos de outras pessoas.

A crença de que os sonhos são premonitórios guarda seu lugar no imaginário popular até os dias atuais. Além de acreditar-se que coisas vistas durante o sono são premonições de acontecimentos futuros tal qual apareceram em sonho, também há o credo de que certos símbolos, ao aparecerem em sonho, têm significado específico. Por exemplo: sonhar com dente caindo significaria a morte de alguém próximo; sonhar com cobra, que alguém em quem você confia é desonesto (falsidade); ou ainda que ao sonhar com determinados animais você deveria apostar em um jogo de azar (tal qual o ilegalmente conhecido como “jogo do bicho”).

Carl Gustav Jung, psiquiatra suíço, afirmava que os sonhos eram meios compensatórios, buscando o equilíbrio dos arquétipos da psiquê entre as forças “anima” (força feminina no masculino), “animus” (força masculina no feminino) e “sombra” (força alimentada pelos aspectos reprimidos do nosso eu). Sendo forças naturais, os sonhos seriam auxiliadores do indivíduo no processo de desenvolvimento pessoal.

Para Jacques Lacan, psicanalista francês, é possível inferir que um sonho é um meio de suprir uma falta na realidade.

“[…] ao de que se trata, à realidade psíquica que se manifesta na frase pronunciada? O sonho prosseguido, não é ele, essencialmente, se assim posso dizer, a homenagem à realidade faltosa — a realidade que não pode mais se dar a não ser repetindo-se infinitamente, num infinitamente jamais atingido despertar?”
Jacques Lacan

Capa do álbum “Scenes From a Memory”, da banda Dream Theater | Ilustração: Dave Mckean

Para a ciência, em tese, durante o sono nossas sinapses cerebrais trabalhariam sendo responsáveis por organizar nossos pensamentos, reorganizando os acontecimentos do dia e tudo o mais que tiver sido captado por nossa consciência, de maneira lúcida ou não. A partir dessa tarefa, os sonhos seriam “um mero subproduto da atividade cerebral noturna” (James Allan Hobson).

Como Analisar Os Sonhos A Partir Da Perspectiva Freudiana

Diante de tantas interpretações quanto ao valor e real função dos sonhos, seja na representação fantasiosa e realização de desejos suprimidos no inconsciente, passando pela função premonitória, até a organização de sinapses cerebrais, se faz necessário escolher uma única linha teórica para que possamos interpretá-los de maneira coerente e eficaz no processo terapêutico do analisando.

De uma perspectiva freudiana, os sonhos, desconexos ou não, devem ser desmontados parte a parte, interpretando-se cada parte separadamente, para depois remontá-las e novamente interpretá-las, desta vez como um todo, juntando os signos revelados por cada etapa da análise onírica. Para isso, Freud leva em conta o que chama de “conteúdo manifesto”, que é o sonho como relatado pelo paciente.

“O sonho é a estrada real que conduz ao inconsciente.”
Sigmund Freud

Para uma adequada análise dos sonhos, deve-se levar em consideração em cada etapa da interpretação o contexto único do indivíduo, suas questões, momento psíquico e estado emocional, o meio em que está inserido, seus costumes sociais e religiosos, interesses, entre outras questões de seu contexto social, psicológico e ambiental. Portanto, deve-se solicitar ao analisando que relate todas as coisas que cada elemento retratado no sonho o faz lembrar ou pensar. Assim, o indivíduo tem papel ativo nas associações dos significados e na interpretação de seus sonhos.

Com base na teoria psicanalítica freudiana de interpretação dos sonhos, um mesmo símbolo sonhado por duas pessoas teria cargas emocionais distintas para cada indivíduo. Sendo assim, seriam signos (símbolo que representa algo diferente de si mesmo) absolutamente díspares, tendo significados completamente diferentes.

A interpretação dos sonhos deve ser feita a partir do subjetivo no indivíduo para o sonhado; e não a partir de um significado generalizado do símbolo sonhado para o indivíduo. O analista deve tomar extremo cuidado e ser vigilante para não imputar significados de sua própria subjetividade aos sonhos do analisando. Depois de analisado, Freud denomina o resultado da interpretação do que foi sonhado de “conteúdo latente”, que seria o real significado do sonho do indivíduo.

A interpretação freudiana dos sonhos também é, de maneira geral, a que mais se aproxima do que é estabelecido hoje pela ciência em relação ao valor e real função dos sonhos.

Texto revisado. Originalmente escrito em 2020, durante a formação em Psicanálise Clínica.

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