O Que é Algolagnia?

Entenda o termo que designa a relação entre prazer sexual e dor

Amanda Aragão
4 min readFeb 25, 2021
Foto: Deon Black

Apesar de comportamentos sexuais socialmente estranhados, sadismo e masoquismo não são considerados pela Psicanálise, por si só, perversões sexuais ou sequer parafilias (distúrbio sexual psíquico).

Sadismo

É chamada de sadismo a obtenção de prazer ou excitação sexual ao infligir dor física ou psicológica a outros, seja por ação real, fantasias ou mesmo o mero impulso.

Masoquismo

Masoquismo é o ato de ter prazer ou excitação sexual ao sentir dor física ou psicológica infligida a si pelo próprio indivíduo ou por terceiros, seja por ação real, fantasias ou mesmo o mero impulso.

Algolagnia

Sadismo e masoquismo sexuais estão intrinsecamente ligados, podendo ser complementares. Muitas vezes, pode ser difícil separar um do outro. Parte dos masoquistas também apresenta fantasias sádicas, e muitas pessoas adeptas de práticas sexuais envolvendo a experienciação de dor apresentam ambas as características, em diferentes níveis de equidade.

Foto: Artem Labunsky

Das muitas vertentes do sadomasoquismo, entre as mais popularmente conhecidas está a prática do BDSM (sigla em inglês para a prática sexual envolvendo bondage, disciplina, dominação e submissão), praticado em grau moderado por muitos indivíduos e que se confunde ao tentarmos delinear as características e diferenciações entre sadismo e masoquismo.

Para além das definições de sadismo e masoquismo na Psicanálise, há múltiplos comportamentos e práticas que envolvem a gratificação ou prazer sexual por meio da dor ou sofrimento psicológicos ou físicos, e que distinguem-se entre si.

O termo algolagnia compreende tanto os conceitos de sadismo e masoquismo quanto quaisquer outras práticas ou manifestações sexuais que envolvam a gratificação pela dor.

“Algolagnia é um termo adequado (concebido por Schrenck-Notzing) para indicar a conexão entre a excitação sexual e o sofrimento, sem referência à sua diferenciação precisa em forma ativa e forma passiva. A forma ativa é chamada comumente sadismo, nome tirado do Marquês de Sade (1740–1814), que o encarnou ligeiramente em sua vida e largamente em seus livros. A forma passiva é chamada masoquismo, originada de Sacher-Masoch (1836–1895), romancista austríaco que descreveu repetidamente em seus romances, este desvio sexual, que ele próprio manifestava. O sadismo é definido geralmente como a excitação sexual associada ao desejo de infligir sofrimento, físico ou moral, ao objeto da excitação. Masoquismo é a excitação sexual ligada ao desejo de ser subjugado fisicamente e humilhado moralmente, pela pessoa que desperta a emoção. Quando integralmente desenvolvida, as ações que constituem a algolagnia, — sejam ativas, sejam passivas, sejam reais, simuladas, simbólicas ou apenas imaginadas — , constituem em si mesmas uma satisfação adequada do impulso sexual, e, no último grau, asseguram a detumescência sem necessidade do coito. […] Assim o termo ‘algolagnia’ abrange convenientemente fenômenos que nem sempre são fáceis de incluir no sadismo ou no masoquismo.”

Havelock Ellis, Psicologia Do Sexo

Shibari | Foto: Damian Serrano

De acordo com a definição do termo, é possível considerarmos a prática sexual sádica como algolagnia ativa e a prática sexual masoquista como algolagnia passiva.

A algolagnia pode ainda incluir manifestações nas quais não é o sofrimento em si que é a fonte do prazer sexual, mas a excitação despertada por ele.

Consentimento

Ao considerarmos sadismo e masoquismo como práticas saudáveis, assim como outros comportamentos sexuais compreendidos por algolagnia, deve-se dar importância e grande ênfase ao fato de que, para que seja considerado uma prática saudável, há de sempre existir o explícito consentimento da(s) outra(s) parte(s) envolvida(s) na prática sexual.

Em alguns casos, indivíduos praticantes das múltiplas manifestações do sadomasoquismo chegam a criar um contrato físico que, apesar de não ter valor jurídico, estipula regras, o que é permitido e o que não é, além de limites para as práticas, visando a segurança e garantindo responsabilidade, a plena consciência dos atos a serem praticados e livre arbítrio das partes envolvidas.

O consentimento deve ser — sempre e de maneira imprescindível — explícito e mútuo em qualquer tipo de prática sexual.

Patologia

Para ser considerado como um quadro patológico, um paciente que tem sadismo ou masoquismo como práticas sexuais comuns deverá apresentar áreas da vida diretamente comprometidas por tais práticas, como sua vida profissional ou relações sociais; além de manifestar sofrimento psíquico clinicamente significativo, também diretamente ligado às práticas.

Aqui, considera-se os termos “sadismo” e “masoquismo” apenas no contexto sexual. No entanto, o termo “sadismo” existe, como patologia, fora do escopo sexual. O termo também é usado no contexto das relações sociais para designar indivíduos que obtém prazer psicológico ao humilhar, inferiorizar, manipular ou dominar outros, caracterizando-se também por crueldade emocional. Tais definições de sadismo são amplamente distintas, já que no contexto sexual o objetivo não é inferiorizar o outro, estando as práticas sadomasoquistas restritas ao contexto sexual.

Contrário à impressão e rejeição sociais derivadas de um moralismo sintomático, sadismo e masoquismo na grande maioria de suas manifestações sexuais se apresentam como práticas saudáveis. Indivíduos e casais que incluem tais práticas na sua vida sexual não são considerados pela Psicanálise pervertidos ou parafílicos (portadores de distúrbio sexual psíquico), desde que não haja interferência em outras áreas importantes de suas vidas por elas diretamente causadas.

Texto revisado. Originalmente escrito em 2020, durante a formação em Psicanálise Clínica.

--

--