O Silêncio no Tratamento Psicanalítico Freudiano

Amanda Aragão
4 min readMar 18, 2021

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O Método Freudiano De Análise

A associação livre é chamada a técnica psicanalítica por excelência. No método desenvolvido por Sigmund Freud, o analisando fala ao analista o que lhe vem à mente, sem julgar a si ou reprimir de maneira consciente seus pensamentos. Os pensamentos devem ser relatados exatamente como vêm à mente do indivíduo, mesmo que de maneira desconexa ou sem “foco”. A partir da manifestação do relato do analisando e de sua observação subjetiva (que envolve diferentes ferramentas, métodos e treino), o psicanalista fará a conexão das informações de modo a construir, junto às associações próprias do analisando, uma interpretação de suas questões terapêuticas, visando o autoconhecimento do indivíduo, que, de maneira ideal, é parte ativa nesse processo.

No entanto, em muitos casos há de se encontrar analisandos que apresentam manifestações de resistência ao tratamento psicanalítico. As resistências podem ser conscientes ou não e se apresentar de maneiras sutis, variadas e complexas. Um desses tipos de resistência pode se expressar na forma do silêncio.

O Silêncio Do Analisando

O silêncio é um tipo de manifestação nítida de resistência por parte do indivíduo. O silêncio é sintomático, geralmente sinalizando ao analista a falta de disposição do analisando para compartilhar ou revelar a ele seus pensamentos ou emoções. A resistência manifestada através do silêncio pode ser consciente ou inconsciente. O analisando nem sempre estará totalmente aberto aos aspectos do processo terapêutico e seu silêncio também pode ser uma representação intencional de contrariação (ou “má vontade”).

Mesmo em casos de indivíduos que, já estando em processo terapêutico, já firmaram o hábito de expressar seus sentimentos, pode haver um episódio de resistência manifestada pelo silêncio. Essa resistência pode ser inconsciente e pode sugerir que algo significante está sendo reprimido.

A resistência é uma manifestação defensiva. Portanto, cabe ao analista analisar os motivos do silêncio.

Em acordo com a literatura do Instituto Brasileiro de Psicanálise, algumas dessas manifestações de defesa presentes no silêncio do analisando podem ser:

  • Defesa contra agentes externos;
  • Defesa contra agentes internos;
  • Defesa contra as interpretações do analista;
  • Defesa contra a perda de controle sobre atos e palavras;
  • Inflição de autopunição, decorrente de sentimento de culpa;
  • Defesa contra reprovação;
  • Outros.

É importante denotar que, qualquer que seja o motivo do silêncio do analisando, ela vem de um impedimento provindo de um fundo de muito poder, capaz de fazer o indivíduo calar. Isto é, na questão psíquica envolvida no silêncio do analisando encontramos uma questão terapêutica que deve ser cuidadosamente endereçada e tratada.

O Que Fazer Frente Ao Silêncio Do Analisando?

Para a Psicanálise freudiana, o uso da linguagem por meio verbal é imprescindível. Como um dos métodos possíveis de abordar e investigar o silêncio, o analista poderá direcionar perguntas abertas ao indivíduo (perguntas para as quais as possibilidades de resposta não possam ser apenas “sim/não”), de modo que este comece, de algum modo, a verbalizar.

Caso a resistência do analisando permaneça, deverá o psicanalista lembrá-lo do Contrato Psicanalítico firmado entre ambos, e que a verbalização é parte imperativa desse contrato. No entanto, isso deve ser feito de maneira a estimular o paciente, lembrando que está ali para auxiliá-lo.

Outros Meios

Freud disse: “Surgirão outras técnicas que substituirão a minha Psicanálise”. A Psicanálise ainda parece estar longe de ser substituída, mas encontra suas irmãs na Psicologia, Psiquiatria e outras formas de psicoterapia e medicina.

Se o analisando não consegue - de maneira alguma - se expressar através da linguagem, poderá se expressar, por exemplo, através da arte. No Brasil, essa técnica foi difundida pela psicanalista Nise da Silveira. Além de pinturas ou desenhos, há outros tipos de técnicas artísticas que poderão ser ferramentas para o processo terapêutico, sendo exemplos a Arteterapia, a Musicoterapia e a Escrita Terapêutica.

Também há as terapias holísticas, praticadas por muitos no Brasil e que concentram numerosos adeptos; no entanto, tais vertentes não encontram lugar na Psicanálise sob a perspectiva freudiana.

O Silêncio Do Analista

O silêncio por parte do psicanalista está imbuído de múltiplas funções. É um elemento fundamental na psicanálise freudiana, e sua utilização como ferramenta deve ser baseada no vínculo psicanalítico pré-estabelecido entre analista e analisando.

Não apenas parte da observação subjetiva do terapeuta, o silêncio, intencionalmente, dá espaço para o autodiálogo e associações próprias do analisando, tornando-o sujeito ativo no processo terapêutico, parte primordial do processo de desenvolvimento emocional do indivíduo.

Para o analisando, o silencio poderá ser um sinal de respeito e acolhimento ou, em total oposição, poderá ser interpretado como distanciamento ou até mesmo negligência por parte do terapeuta. Em outra perspectiva, também poderá ser um incentivo, exercendo um pequeno grau de pressão, para que o analisando comunique-se mais ou tenha tempo para ouvir-se.

O silêncio como intervenção psicanalítica pode ser ativo ou passivo. Assim, a partir do vínculo terapêutico e das questões psíquicas do indivíduo, poderá atingir diferentes objetivos e resultados.

No silêncio do terapeuta, a escuta é seu maior valor.

Texto revisado. Originalmente escrito em 2020, durante a formação em Psicanálise Clínica.

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